07/03/11
Caros Amigos,
No seguimento do processo de Candidatura aos Apoios Directos (anuais e bienais) ao Teatro e, após, a decisão da Comissão de Acompanhamento sobre os financiamentos que decidiu propor a cada estrutura e a justificação desses mesmos montantes, sustentada nas respectivas actas, entende a Companhia de Teatro de Braga informar todos os interessados neste processo, da sua posição em sede de “Audiência de Interessados”.
Porque este processo devia e deve ser o mais transparente e democrático, como as circunstâncias de crise o exigem, decidimos fazê-lo.
Exmo. Senhor
Eng. João Aidos, director
Direcção Geral das Artes
Lisboa
Assunto: Audiência de interessados.
Nos termos do artigo 100º e ss. do Código do Procedimento Administrativo (CPA) vem a Companhia de Teatro de Braga, pronunciar-se, por escrito, em sede de audiência de interessados.
Introdução: o estado da alma.
A Companhia de Teatro de Braga vem ao abrigo desta “figura regimental” chamemos-lhe assim, manifestar o mais profundo desagrado pela discriminação negativa de que foi vítima, na farsa chamada Concurso de Apoio Directo às Artes. A manifestação deste nosso “estado de alma” estará, obviamente fora do contexto do meritíssimo júri, como estará, obviamente, fora da alçada gestionária quer do Senhor Director-Geral quer até da Senhora Ministra da Cultura. Aliás, poderemos facilmente concluir pelos resultados e pelas manifestações convulsas das medidas que vão sendo tomadas, que nada tem a ver com nada e muito menos com Política. Assim e não esperando NADA de V. Exas. para lá do já executado, este documento não terá outro valor senão o de manifestar a todos a nossa maior indignação pelo papel de carrascos, sem memória nem visão, que tão resolutamente desempenharam esperando que, pelo menos, tenham sido bem ressarcidos por tão desagradável trabalho, não ficando pelas módicas quantias que a senhora Ministra noutras sedes e fora do contexto tem por hábito criticar.
Sim, este Concurso foi uma farsa para todos e uma tragédia para alguns. Desde os seus primeiros passos, aquando da “teatral reunião” com a senhora Ministra e o Senhor Director-Geral, na Cinemateca, onde foi solicitado aos agentes do sector que se propusessem, eles mesmos, distribuir os apoios com um corte de 25%. Logo ali foi dito que não se entendia, neste contexto, a razão do concurso. O Ministério insistiu sobre a obrigatoriedade legal de o promover. Pois bem, percebe-se agora, no final deste processo que, afinal, havia uma “agenda escondida”, como adiante se demonstrará.
Fracos gestores, que pretendem ignorar a política, para ficarem nesse sublime patamar dos técnicos. Falsos técnicos, que em matéria de análise se pretendem confundir com os artistas. Deslustrados júris, que nas decisões que assumem, não atingem o patamar de equidistância, conhecimento e coerência, que se exige da função. Mas sejamos condescendentes: neste pequeno país grande de invejas e pequenos jogos, começa a ser cada dia mais difícil encontrar júris. Também aqui a vida não está fácil.
Passemos então ao parecer sobre a Acta do douto Júri justificativa do apoio à Companhia de Teatro de Braga, num último esforço de tirarmos a cabeça da guilhotina, em razão dos 7 pecados que teremos cometido.
Sobre o primeiro pecado: falar de política cultural.
Como é possível que ousemos falar de política cultural no preenchimento do formulário de Candidatura? Parece que não nos limitamos a falar, teremos feito “alguns comentários e divagações sobre política cultural cuja pertinência escapa a esta Comissão…” é pena! Não existe ninguém que informe o Júri que a posição que assumiram é clara e inequivocamente política? Não têm consciência do papel que desempenharam? É grave. E será mais grave se não aprofundarem esta questão e nos informarem concretamente sobre “os comentários e divagações” produzidas em sede de candidatura. Exigimos respeito! Em matéria tão relevante como financiamento a uma estrutura de criação artística com 31 anos de actividade e 16 pessoas, não basta fazer, isso sim, comentários dignos de conversa de café. Explique-nos o Júri, onde e em que passagens se sentiu “fora do contexto” nas afirmações assumidas pela CTB. O assunto não é despiciendo, é grave! Pretende o Júri, colocar-se acima de qualquer patamar fora da democracia? Sabemos que nos tempos que correm é apelativa a ideia de “mandar calar” sobretudo em matéria de financiamento e apoios. Mas não é essa a nossa matriz. Não assuma o Júri, por ignorância ou falta de memória, a relevância que não demonstra ter. A responsabilidade do Júri ou Comissão de Apreciação, não se esgota a “apreciar candidaturas em formulários ridículos”, para isso há técnicos especializados.
Enfim, em democracia a Palavra responsabiliza. Nós assinamos e assumimos o que dizemos. Desafiamos o Júri a explicitar quais os comentários sobre política cultural de que não gostou e em que percentagem terão contribuído para o montante atribuído?
Sobre o segundo pecado: a formação ou como criar confusão.
Onde está a confusão? No Júri? Não acreditamos. Sejamos objectivos. A CTB à luz do entendimento que faz do quadro legislativo que enquadra as Candidaturas QREN há muitos anos a esta parte, à luz do entendimento que também fez o senhor Director-Geral das Artes, em reunião havida, depois de lhe termos dado exemplos de medidas de política cultural (lá está!) que, no nosso entendimento deveriam ter sido tomadas em tempo útil, preventivamente à crise e relativamente à utilização de financiamentos QREN. A CTB sempre viu mal defendida a ideia que esses financiamentos não poderiam ser utilizados em projectos já financiados pelo Ministério É assim ou não? O que mudou nestes últimos três meses? Sejamos claros. A CTB desenvolve ao longo de mais de 10 anos, projectos de formação de públicos. Financiados por medidas específicas no âmbito da CCDRN. Projectos como Teatro-Escola-Teatro; AU! Alternativas Urbanas, 1 e 2; Amádixão – as Palavras Mal Ditas; entre outros. Agora desde 2009 o Projecto BragaCult. Só não sabe quem não quer. A DGArtes tem os Relatórios, a documentação, pode aceder aos sites e aos blogs respectivos. SEMPRE estes projectos foram considerados, como aliás faz sentido, pelos vários responsáveis pela DGArtes e respectivos Júris. Considera a CTB que deverá ser mesmo um factor de majoração no que concerne à diversificação de financiamentos.
Com que critério sério é que, numa situação de crise, o júri pode ignorar estes factos e retirar a conclusão que “é criada alguma confusão quando se referem actividades que a entidade quer ver reconhecidas para efeitos de majoração, mas que não pretende contratualizar com a DGArtes – como as acções de formação/serviços educativos”. Conhecem a Lei, ou ela foi alterada só para alguns, como aliás parece transcorrer de informações que correm, sobre reuniões que se vão fazendo com alguns, sobre algumas questões? A questão é: A CTB faz ou não formação de públicos?
Mesmo assim, e só para conferir com a informação que certamente terá chegado ao júri, via DGArtes, sobre esta matéria: a CTB realizou nos últimos 3 anos, 47 acções de formação / oficinas para 2 654 pessoas em Braga e distrito e 8 fora do país (Brasil).
A DGArtes e o Júri têm disso informação ou não? Isso deve ser valorado ou não? Será muito esquizofrénico considerar a valoração zero nessa área como um item da tal agenda escondida?
Terceiro pecado: pode não ser acolhimento.
O mesmo sobre acolhimento. Vejamos. A CTB é companhia residente do Teatro Circo desde 1986. Esse estatuto está sustentado por um protocolo com a Autarquia. O Ministério tem esse documento. Lá estão claras as relações e a responsabilidade das partes, também no que concerne a acolhimentos. A DGArtes sabe, pelos Relatórios e por outros documentos, que a CTB tem relações, protocolos e integra plataformas de intercâmbio, análise e colaboração com outras estruturas de criação nacionais e estrangeiras, onde a circulação de espectáculos entre os espaços e as cidades, são um dos vectores (Coimbra, Évora, Montemuro, Faro, Covilhã, ou Almada, Galiza, Itália/ Sardenha, Brasil). E uma das razões fulcrais destas plataformas resulta do facto muito conhecido do Júri, de vivermos uma quase ditadura dos eufemísticamente chamados “directores artísticos”dos espaços, vulgo programadores. Aqui reside o ponto. E a ligeireza do comentário da Acta “ou podem não ser da sua total responsabilidade – como os acolhimentos do Teatro Circo”. Como interpretar este assassino comentário? À luz da noção de ética dos elementos do Júri? Ou como falta de verdade no que afirmamos?
E o acento na suspeita “pode não ser”? Como classificar? Estamos num segundo exemplo da tal agenda escondida, dizemos nós! Mas entendemos que o júri deve explicar, em nome da verdade e da ética. O nosso trabalho de 31 anos exige-o.
Quarto pecado: no que toca ao trabalho artístico.
“A companhia não apresenta alterações significativas ao que tem vindo a desenvolver até ao momento, propondo alguns clássicos da dramaturgia internacional para 2012, e a criação de espectáculos baseados em textos escritos e encenados por alguns dos seus colaboradores regulares” Uma pérola de análise do júri. Só se pode depreender que o Júri não leu nem os pressupostos em que assenta toda actividade da CTB no período em causa (2011/2012) nem onde começou este ciclo. Como não leu (que é também grave), nem conhece a matriz do projecto da CTB desde a sua formação e que norteia toda a escolha do nosso reportório: “a CTB cruza o sempre renovado interesse pelas novas dramaturgias com a experimentação, através das nossas práticas teatrais, sobre o legado dramatúrgico da Humanidade: os clássicos”. Na sua infinita incultura teatral, denomina O Despertar da Primavera de Weedekind e a Oresteia de Ésquilo, como dramaturgia internacional, um texto inédito escrito e encenado pelo dramaturgo e encenador Alexej Schipenko, que trabalha há longos anos na Alemanha e noutros países, como qualquer coisa sem importância, ou de propor um texto inédito de Regina Guimarães. Aos dois textos chama de “espectáculos baseados”. Não, a CTB, não tem como prática construir espectáculos a partir de corte e costura, talhados em cima de textos, muito em voga nos meios muito muito póspós modernos, muito muito transversais e emergentes, que mais não são que a grande descoberta do umbigo em mentes que brilham de ignorância. Isto faz, a nosso ver toda a diferença, quanto a conceitos e práticas teatrais. O que havemos de fazer? E como classificar o facto da CTB ter nos seus colaboradores regulares dramaturgos como Regina Guimarães, Anna Langhoff ou Alexej Schipenko? Percebe-se que para o Júri é desprestigiante. Não dá mais-valia ao projecto. Registamos. Propomos que nos sugiram nomes para na próxima melhorarmos. Não haverá aqui também um pozinho de agenda outra?
Quinto pecado: o orçamento equilibrado e detalhado, mas…
“o montante global das despesas é elevado, levantando dúvidas sobre algumas opções como o valor do cachet a um encenador…” Caro Júri, sobre gestão da CTB sabemos nós. Temos 31 anos de actividade. Com os apoios do Ministério ao longo dos anos, se não soubéssemos gerir já teríamos desaparecido. Entram num campo que não é o vosso, pois não querem ouvir fala de política. Aproveitem e questionem o Ministério sobre a diferença de conceitos entre Companhia, grupo, projecto pontual. O que define e diferencia, estes três entidades? E perceberão se quiserem. A CTB tem 16 pessoas com trabalho regular. Dessas, 11 estão no quadro, isto é, fazemos descontos para a Segurança Social. O que corresponde a mais de 25 000€/ ano, que a CTB paga. Pois, como sabem, o Ministério nada fez sobre o estatuto profissional, nem sobre a segurança do actor. Nós assumimos as nossas responsabilidades. A CTB é uma companhia de reportório, como se pode observar na candidatura e nos Relatórios. Por uma vez, isso é valorável ou não? Será que o Júri defende o alinhamento pela precariedade dos projectos e das pessoas? Recusamo-nos a ser tratados como projecto pontual em nome dos “interesses espertos” de políticos provincianos, travestidos de técnicos, que se escondem atrás de cosmopolitismos serôdios. Na vida, na arte e na gestão. Estamos disponíveis para discutir, não com o júri, mas com os responsáveis do Ministério, estas matérias.
É verdade que o cachet do encenador em causa é elevado. Estamos de acordo no contexto. Mas isso não faz a primavera, aliás, vale a pena referir que se trata, no caso, de uma co-produção.
Sexto pecado: as parcerias.
“apesar da companhia indicar várias parcerias, nem todas estão confirmadas documentalmente”. Caríssimo Júri, aqui está uma diferença entre uma companhia que desenvolve as suas actividades há 31 anos de modo continuado, que mantém 4 / 5 espectáculos em reportório, que em cada ano produz 3 / 4 novas criações e que, por via disso, não é, nem deve ser observado como um projecto pontual.
A CTB não está em condições para no ano em que termina o apoio, assumir responsabilidades para lá do razoável. E o razoável é o que resulta da sistémica incapacidade dos governos e dos titulares da pasta da Cultura em entenderem o sector. A sua única preocupação, para lá da conversa de circunstância nos primeiros 6 meses (em que afirmam que agora é que vai ser), é a de se manterem no lugar. Há dois tipos de sobrevivência nas artes do palco: a dos artistas e a dos políticos da cultura. Para lá disso, só o esforço dos criadores. Como resolver então essa falta grave de “nem todas as parcerias estarem documentadas?”
Proposta: Um Júri ou Comissão de Apreciação tem o dever de conhecer, saber o histórico, estar informado sobre a actividade anterior da estrutura, da sua capacidade de realização, dos desvios entre o contratualizado e o realizado, dos números, das contas, etc. etc. O Júri ou Comissão de Apreciação deve conhecer os Relatórios de Actividade, o projecto artístico da estrutura, analisar se a proposta é conforme. Não é por essa razão que a DGArtes informa as companhias da importância de enviar os Relatórios de Actividade antes da Comissão se pronunciar? Não é por essas razões que o Júri integra um quadro da DGArtes em cada sector? O Júri não é informado sobre os pareceres de uma outra Comissão de Acompanhamento de cada Região, que tem por missão acompanhar a actividade de cada entidade? É a DGArtes que não tem memória ou o Júri que assume o papel de Redentor e que julga que antes de si foi o Dilúvio?
Não! A CTB não embarca neste jogo, aparentemente justiceiro e cínico. Nós CTB, não fazemos parte dos três dias de Carnaval que sempre antecedem o final da apresentação das Candidaturas, com as célebres cartinhas e telefonemazinhos a solicitar o ”tal documento comprovativo do possível interesse se” que fará certamente as delícias do Júri e alimentará a auto-estima dos tais programadores/directores artísticos, mas que torna estes formulários num pró-forma quixotesco. A questão é saber se a CTB tem ou não tem, ao longo dos anos, desenvolvido parcerias nacionais e estrangeiras quanto à criação, formação, acolhimento. Se a CTB é ou não uma estrutura de criação credível para o Ministério, isto é, se é ou não considerado parceiro idóneo para o desenvolvimento de um projecto cultural de interesse público.
Sétimo pecado: sobre comprovativos da circulação nacional e internacional.
Também aqui faltam comprovativos. Pois foi! Esquecemo-nos de guardar os comprovativos das portagens. Mas guardamos as respostas do Instituto Camões, uma vez que os sempre tão anunciados projectos de internacionalização se projectam no vácuo com falta de verbas. Mesmo assim, não é sem alguma ironia que conferimos nos últimos 3 anos os seguintes resultados:
a. Espectáculos realizados em território nacional fora da sede (Braga)…88
b. Espectáculos fora de Portugal (Espanha, Brasil, Itália)………………15
Não serão números fantásticos, como gostaria o Ministério e o Júri, mas que diabo, ninguém pode ignorar que aconteceram. Aliás, e sem petulância, o trabalho desenvolvido pela CTB e não apenas na apresentação de espectáculos, mas também na formação, mereceram em 2010 o reconhecimento por parte do Presidente da República quando em Santarém, por altura das Comemorações do Dia de Portugal, convidou o director da Companhia, num universo de 50 personalidades que se tinham distinguido em várias áreas, fora de Portugal, para um almoço de homenagem. Mesmo assim arriscamos comparações, seguindo a metodologia do júri, no caso do cachet ao encenador. Contaram ZERO para o Júri, pelas razões aduzidas. Mas para nós essas razões não são suficientes.
As verdadeiras razões destas notas avulsas em formato de acta ressoam a tarefa mal executada, sem ética e sem princípios. Martelada.
A agenda escondida cumpriu-se no seu objectivo: Anunciar os cortes de 25% a todos, para criar ambiente. Propor democraticamente que as estruturas se digladiassem pelos tostões, para gáudio do imperador e no fim abrir concurso para eliminar alguns. Essa agenda foi cumprida. À CTB o corte final foi de 82 000€, acima dos 25% anunciados. Tudo estaria certo se… na análise global ao Norte, para não irmos mais longe, não verificássemos que afinal a CTB foi das que sofreu um dos maiores cortes, num universo em que muitos subiram. Nada temos contra os aumentos, que deveriam ser generalizados. Mas temos tudo contra o método descoberto para as pontuações.
Três zeros (0;0;0) nos critérios de apreciação, quanto a circulação regular, circulação internacional e serviços educativos) é uma falácia e um subterfúgio para executar o corte. E, porque não corresponde à realidade, exigimos explicação cabal. E se no final do ano se cumprir o que na Candidatura se propõe, quem assume a responsabilidade?
Como exemplo de “manifestação convulsa de medida política tomada” fica a pergunta:
Como interpretar o anúncio, depois de todo este espalhafato, das companhias quadrienais possam ver reduzida a sua percentagem de corte, graças à Santa Casa, quando muitas das bienais viram substancialmente reduzido o seu apoio?
Os cortes passaram de cegos a supletivos? Qual o critério?
Pois é! É difícil discutir Cultura sem falar de Política.
Assim, considerando a proposta de financiamento dessa Comissão de Apreciação, sobre a Candidatura da Companhia de Teatro de Braga e os seus pressupostos de análise em que a mesma assenta, vimos nos termos do artigo 100º e ss. do Código do Procedimento Administrativo e na sequência do que neste documento está argumentado, requerer a reavaliação da pontuação atribuída no critério c) e nos factores de majoração a); b) e c).
Com os melhores cumprimentos,
Rui Madeira, director
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